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Ficha técnica: Farinha de peixe

Ficha técnica com o valor nutricional (comparação de tabelas), produção e estudos mais recentes sobre a farinha de peixe.

Introdução

A farinha de peixe é um co-produto de origem animal, sendo uma fonte proteica de alta qualidade para a alimentação animal. Atualmente, a farinha de peixe é fabricada a partir de espécies capturadas secundariamente na pesca comercial e que não têm interesse para o consumo humano ou de frações da indústria extrativista e de conservas.

Durante o processamento, são diferenciadas 3 frações principais: sólidos (matéria seca sem gordura), óleo e água. A farinha de peixe é obtida por processamento que envolve cocção, prensagem, secagem e moagem. Após a cocção, geralmente a mais de 90ºC, procede-se à prensagem onde são eliminados os líquidos lixiviados e obtido um "bolo de prensagem". Os líquidos são decantados, os sobrenadantes são centrifugados para obter os solúveis de peixe, os quais são concentrados por evaporação suave (que podem ser comercializados como um produto separado ou incorporados de volta na pasta). O bolo de prensagem e os ingredientes solúveis, caso sejam reincorporados, são misturados antes da secagem para se obter farinha de peixe com humidade final máxima de 10%.

Os processados de peixe cru a baixa temperatura (<70ºC) produzem produtos de alta qualidade (pois não apresentam reações de Maillard e oferecem melhor disponibilidade de aminoácidos) e geralmente não estão associados à indústria extrativista e de conservas, mas sim ao processamento de pescado com o objetivo direto de obter farinha. No entanto, para evitar a degradação de proteínas e óleo, peixes crus são frequentemente arrefecidos (usando sistemas de água fria ou mistura de gelo-peixe) ou preservados quimicamente (com nitrito de sódio ou formaldeído).

Assim, a composição nutricional e a qualidade da farinha de peixe estão diretamente relacionadas com o tipo de peixe utilizado, a sua frescura, a sua conservação e o processamento térmico. Neste sentido, as farinhas de peixe azul têm maior teor de proteína e gordura (> 70% e 9%, respectivamente) e menor teor de cinzas (<15%) do que as farinhas de peixe branco. Em termos de qualidade, a conservação tem impacto direto na geração de compostos de degradação que podem alterar a sua aceitabilidade e palatabilidade para os suínos.

Indiretamente, a farinha de peixe é uma boa fonte de minerais, especialmente cálcio e fósforo, que estão amplamente disponíveis, mas também de microminerais essenciais (Se, Zn, Cu, Fe e Zn).

Estudo comparativo dos valores nutricionais

Os sistemas utilizados na comparação são FEDNA (Espanhola), CVB (Holandesa), INRA (Francesa), NRC (EUA) e do Brasil.

FEDNA1 CVB1 INRA2 NRC3 BRASIL4
MS (%) 92,0-93,0 91,1-91,7 94,3-92,0 93,7 91,7-92,0
Valor energético (kcal/kg)
Proteína bruta (%) 59,0-70,0 56,3-70,7 62,6-69,9 63,3 54,6-63,8
Extrato etéreo (%) 9,0-9,5 14,2-10,1 8,9-9,3 9,7 8,1-5,9
Fibra bruta (%) 1,0-0,4 0,0 0,0 0,2 0,7-0,0
Amido (%) 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0
Açúcares (%) 0,0 0,0 0.0 - -
ED crescimento 3540-4230 - 3720-4070 3958 3050-3170
EM crescimento 3090-3590 - 3370-3680 3528 2740-2845
EL crescimento 1965-2770 2513-2464 2190-2370 2351 1733-1726
EL reprodutoras 1965-2270 2513-2464 2180-2360 2351 1733-1736
Valor proteico
Digestibilidade proteína bruta (%) 86-89 85 85 85 79-87,6
Composição aminoácidos (% PB)
Lys 7,05-7,50 7,6 7,40-7,50 7,21 6,10-6,77
Met 2,50-2,80 2,8 2,60-2,80 2,73 2,36-2,51
Met + Cys 3,30-3,70 3,7 3,40-3,70 3,70 4,12-3,39
Thr 4,10-4,10 4,2 4,10-4,20 4,10 4,03-4,04
Trp 0,95-1,05 1,1 1,00 1,00 0,81-0,96
Ile 4,10-4-10 4,2 4,00-4,30 4,05 3,81-3,79
Val 4,75-4,90 4,9 4,80-5,10 4,84 4,74-4,70
Arg 6,05-5,90 5,9 6,10-5,80 6,07 5,95-6,10
Digestibilidade ileal estandartizada (% PB)
Lys 89-91 89-90 90-92 86 77,1-88,1
Met 88-90 89-91 91-93 87 74,3-87,2
Met + Cys 86-88 81,5 89-91 75,5 64,4-84,6
Thr 88-88 88-86 86-89 81 67,6-84,9
Trp 86-87 86-89 89-91 76 73,5-84,4
Ile 90-91 90-89 89-91 83 76,5-88,2
Val 89-90 89-88 88-90 83 70,1-85,9
Arg 90-91 92-94 94-95 86 83,1-88,5
Minerais (%)
Ca 5,30-2,55 4,01-2,70 5,54-2,41 4,28 5,75-4,70
P 3,00-2,00 2,64-2,19 3,10-2,06 2,93 2,99-2,41
P fítico 0,00 0,00 0,00 0,0 0,00
P disponível 3,00-2,00 - - - 2,99-2,41
P digestível 2,40-1,60 2,03-1,69 2,39-1,59 2,40 2,41-1,94
Na 0,84-0,90 1,05 1,12-0,95 - 0,86-0,50
Cl 1,50-1,55 1,52-1,53 1,63-1,51 - 0,9-nd
K 0,85-1,18 0,64-1,40 0,74-1,22 0,62 0,68-0,58
Mg 0,2 0,23 0,26-0,19 0,13 0,16-nd

1Para os sistemas de avaliação FEDNA e CVB é apresentado um intervalo de valores (mínimo e máximo) procedentes da integração das 4 classificações diferentes que este sistema de avaliação considera basicamente em função do conteúdo em proteína (59%, 62-64%, 65-67% e 70%, respectivamente), que difere basicamente pelo tipo de peixe utilizado e processo de obtenção (alta (>90ºC) ou baixa (<70ºC) temperatura).

2Para o sistema de avaliação INRA é apresentado um intervalo de valores (mínimo e máximo) procedentes da integração das 4 classificações diferentes que este sistema de avaliação considera em função do nível de proteína bruta (62%, 65% e 70%) seguindo a mesma ideia que FEDNA e CVB.

3Para o sistema de avaliação NRC é apresentado apenas o dado médio, já que o sistema de avaliação americano assume que não há capacidade para discernir entre qualidades e que se mistura tudo, com o que considera uma só qualidade como valor médio (64% proteína).

4Para o sistema de avaliação BRASIL é apresentado um intervalo de valores (mínimo e máximo) procedentes da integração de 2 classificações diferentes que este sistema de avaliação considera em função do nível de proteína bruta (54% e 61%) basicamente explicado pela qualidade do peixe utilizado.

Ao contrário de outros ingredientes proteicos, o leque de qualidades e categorias considerado pela maioria dos sistemas de avaliação selecionados é muito amplo, apresentando grande variabilidade, devido à origem e qualidade da matéria-prima (peixes brancos, azuis ou mistura) , conservação (fresco e cru ou de outros processos anteriores na indústria de conservas) e processamento para obtenção de farinha (temperatura, extração, teor de solúvel). No caso do BRASIL, embora haja uma diferença entre duas qualidades com base no teor máximo de proteína e área de produção, tudo indica que se trata de farinha obtida de peixe branco. Por fim, o NRC recusa-se a assumir uma diferenciação por qualidade, alegando que é difícil caracterizar e evitar misturas e variabilidade entre itens, considerando apenas um valor médio como único produto ou categoria. De forma geral, o valor médio da proteína entre os diferentes sistemas de titulação selecionados é de 63,8% ± 4,7, observando-se uma grande variabilidade, o que justifica a diferenciação de qualidades entre os sistemas de avaliação selecionados com exceção do NRC.

Embora seja indicado que a qualidade e a concentração da proteína estão diretamente relacionadas com o tipo de peixe utilizado (maior proteína para peixes oleosos), esta representa diretamente um maior teor de gordura. Esta relação positiva é clara para FEDNA (r2> 0,95) e INRA (r2> 0,85), porém para CVB esta relação é inversamente proporcional (r2 = -0,94), indicando um impacto do processamento e extração do óleo de peixe na avaliação do teor de gordura superior ao tipo de peixe (assumindo que quanto maior a concentração de proteína, menor o teor de gordura). O BRASIL, embora com apenas duas categorias, também apresenta a mesma tendência do CVB, mas segue uma explicação mais lógica, tanto no teor de proteínas como de gordura, pelo tipo de pescado utilizado na área de produção e consumo (peixe branco). Por fim, o NRC permanece numa faixa média no teor de proteína e gordura (63,3% e 9,7%, respectivamente), o que responde claramente à decisão tomada de apresentar um único valor médio.

O intervalo de matéria seca é muito estável para todos os sistemas apresentando pouca variação entre eles (92,2%±0,8).

A variação e resposta observada no teor de proteína associada ao processo de obtenção do produto e a origem do peixe é consistente para o teor de aminoácidos, tomando a lisina como referência (sendo a referência para o resto do AA) para todos os sistemas de avaliação selecionados, com exceção de CVB que atribui o mesmo valor à lisina e o resto de aminoácidos para todas as qualidades consideradas. O valor de lisina é de 7,6%, superior até mesmo aos 7,5% considerados pela FEDNA e INRA para farinha de peixe com 70% de proteína. Para os demais aminoácidos, o CVB apresenta valores médios superiores entre 5 e 8 pontos percentuais em relação ao FEDNA, INRA e NRC. O BRASIL, de acordo com os níveis de proteína e aminoácidos considerados, apresenta valores menores para a maioria entre 8 e 10 pontos percentuais a menos, sendo o valor mais extremo em relação ao CVB o valor do triptofano (20 pontos percentuais a menos).

O coeficiente de digestibilidade da proteína e da lisina varia entre 85-89% e 82,6-90,6%, respectivamente. Como para o teor de aminoácidos, é observada uma estimativa por cima do coeficiente de digestibilidade atribuído a FEDNA e INRA (+ 1% e + 2%, respectivamente e com um extremo de + 7% e + 10% especificamente para o enxofre) e uma estimativa para baixo do BRASIL e do NRC em relação ao CVB (-10% e -8%).

Devido à sua origem, a farinha de peixe é uma fonte de proteína que tem um alto conteúdo em gordura. Podemos observar um maior impacto do conteúdo em gordura sobre a estimativa do valor de energia (r2 = 0,47) posto que a influência do conteúdo em proteína não permite explicar nenhum efeito sobre a previsão do valor de energia (R2 < 0,20). Esta resposta é muito clara sobre a estimativa do valor de EL, na qual se pode observar que enquanto FEDNA e INRA apresentam um aumento de EL associado ao nível de proteína e gordura (EL + 805kcal/kg y + 180kcal/kg inferior), CVB apresenta uma redução de 49 kcal/kg. BRASIL no intervalo baixo de proteína, mas com a mesma tendência inversa que com o conteúdo em gordura, também apresenta uma redução na estimativa da EL mas em menor medida (<10kcal/kg). Pelo contrário, para a arginina a tendência, ainda que mínima (1%) a avaliação média apresentada é inferior para CVB que para o resto dos sistemas estudados.

O tipo e qualidade do peixe utilizado tem um impacto muito importante no conteúdo final de minerais apresentados pelo produto (oscilando entre 2,5%-5,7% de Ca e 2%-3,1% de P) sendo os valores mais baixos para os intervalos de proteína superiores para FEDNA, CVB e INRA e sendo valores mais altos para BRASIL (oscilando entre 4,7%-5,7% de Ca e 2,4%-3% de P) devido ao tipo de peixe e nível de proteína considerado ou NRC por apresentar valores médios (4,3% de Ca e 2,9% de P). É importante destacar que os valores P digestível são muito semelhantes entre sistemas de avaliação oscilando entre 1,6-2,5% sendo os intervalos praticamente idênticos para FEDNA e INRA e menos variáveis para CVB para intervalos de proteína similares.

Descobertas recentes

1.A levedura Vadura torula tem uma maior digestibilidade de aminoácidos e fósforo, mas não de energia, em comparação com uma fonte comercial de farinha de peixe para leitões desmamados.

Esta pesquisa foi realizada para testar a hipótese de que a digestibilidade ileal estandartizada (DIE) de AA, as concentrações de ED e EM e a digestibilidade estandartizada do trato total (DETT) de P numa fonte de levedura torula não são diferentes dos valores obtidos com a farinha de peixe de Menhaden. O estudo concluiu que a DIE de AA e a DETT de P na levedura torula é maior que na farinha de peixe, por outro lado os valores para a concentração de ED e EM na levedura não são diferentes dos da farinha de peixe.

2. Efeitos de diferentes fontes de proteínas que substituem completamente a farinha de peixe em dietas baixas em proteínas sobre o rendimento do crescimento, a fisiologia digestiva intestinal e a digestão e metabolismo do nitrogênio em leitões na creche.

O estudo comparou os efeitos sobre o rendimento do crescimento, fisiologia digestiva intestinal e digestão e metabolismo do nitrogênio dos leitões, da substituição da farinha de peixe por proteínas selecionadas em dietas baixas em proteína. Foram comparadas cinco dietas com PB reduzida, suplementado com aminoácidos contendo 4% S50, HP300, proteína concentrada de semente de algodão degosipolisada (PADC), P50 ou farinha de peixe. Em comparação com a farinha de peixe, as proteínas da dieta não afetaram o rendimento de crescimento, digestibilidade aparente do trato total, níveis de hormônios séricos, digestibilidade ileal aparente (DIA) de PC e da maioria dos AA, morfologia duodenal e ileal, a atividade de enzimas digestivas ou o pH no intestino delgado de leitões. Entretanto, HP300, PADC e P50 diminuíram a excreção fecal de N devido ao ganho de peso. Melhoraram o DIA de Ile em S50 e HP300 e de Glu em P50 e o DIA de Gly em outras proteínas foi reduzido. S50 e P50 reduziram o conteúdo de ácido isobutírico e isovalérico do cólon. S50 e HP300 diminuíram a altura das vilosidades do jejuno. PADC aumentou a atividade da pepsina no estômago. S50, HP300 e CDCP reduziram o pH no cólon proximal. Em geral, proteínas selecionadas podem substituir completamente a farinha de peixe em dietas de baixa proteína, sem afetar o crescimento dos leitões, mantendo a fisiologia digestiva intestinal e a digestão e metabolismo do nitrogênio.

3. Substituição parcial do bagaço de soja com diferentes fontes de proteínas em rações para leitões durante a creche.

Este estudo avaliou a substituição parcial do bagaço de soja por diferentes fontes de proteína, incluindo farinha de peixe, em dietas de leitões durante a creche em termos de digestibilidade, balanço de nitrogênio, rendimento de crescimento e parâmetros sanguíneos. Concluiu-se que o uso de ração com bagaço de soja como única fonte de proteína influencia uma maior excreção total de nitrogênio, reduz o rendimento de crescimento dos leitões e aumenta os níveis de ureia plasmática na fase pré-inicial em comparação com dietas com farinha de peixe e concentrado de proteína de soja.

4. Efeito da substituição de farinha de peixe com hidrolizado de proteínas de sub-produto de bagre (Pangasius hypophthalmus) sobre o rendimento do crescimento e a incidência de diarreia em leitões desmamados.

O presente estudo foi conduzido para avaliar o efeito do tipo de peixe usado para substituir a farinha de peixe no rendimento e na saúde intestinal de leitões (farinha de peixe comum versus farinha de hidrolisado de proteína de subproduto de bagre). O estudo concluiu que é possível e adequado substituir até 100% da farinha de peixe por proteínas do sub-produto hidrolisado do bagre em dietas para leitões e suínos em crescimento, pois resulta em melhores GMD e CI, menor custo / ganho de ração, bem como menor incidência de diarreia e melhor pontuação fecal.

5. Digestibilidade ileal aparente de nutrientes e aminoácidos no bagaço de soja, farinha de peixe, proteína plasmática seca por pulverização e bagaço de soja fermentado para leitões desmamados.

Este estudo procurou determinar se a fermentação poderia aumentar ainda mais a digestibilidade ileal aparente da matéria seca, o nitrogênio, a energia e os aminoácidos (AA) no bagaço de soja fermentado do que no bagaço de soja, farinha de peixe e proteína plasmática seca por pulverização. O processo de fermentação melhorou a qualidade nutricional do bagaço de soja, devido à redução dos fatores anti-nutricionais, o que levou a uma melhoria na digestibilidade do AA semelhante à da farinha de peixe e da proteína plasmática seca por pulverização. Portanto, o seu uso como ingrediente especializado para dietas de animais jovens é adequado na tentativa de reduzir os custos da dieta.

Referências

FEDNA: http://www.fundacionfedna.org/
FND. CVB Feed Table 2016. http://www.cvbdiervoeding.nl
INRA. Sauvant D, Perez, J, y Tran G, 2004, Tables de composition et de valeur nutritive des matières premières destinées aux animaux d'élevage.
NRC 1982. United States-Canadian Tables of Feed Composition: Nutritional Data for United States and Canadian Feeds, Third Revision.
Rostagno, H,S, 2017, Tabelas Brasileiras para aves e suínos. Composição de Alimentos e Requerimentos Nutricionais, 4° Ed.

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